Ivo nos anos 70. Foto Dico Kremer.
Com o Ivo cantei muitos rocks rurais
Morre em Curitiba o músico Ivo Rodrigues, o Ivo da Chave e da banda Blindagem. Talentoso cantor e guitarrista, meu amigo desde os anos 60, era o cara que me transportava a Woodstock sempre que eu precisava estar lá.
Quando entrei num boteco no balneário de Matinhos, no Paraná, numa noite de verão, pra tomar uma cerveja, ele estava nos fundos, tocando violão e cantando (como se estivesse em Woodstock) Do you wanna dance? de Johnny Rivers. A voz solta e os cabelos compridos chegaram primeiro e fui logo me manifestando na segunda música:
- Bicho, você gosta de tocar o que eu gosto de ouvir.
Ele mandou outras de igual calibre, Beatles, Donovan, Ronnie Cord,... Nos tornamos amigos próximos, com tratamento de compadre, muitas viagens, baseados, sempre a caminho do rio das pedras na estrada para Santa Catarina. Dois casais (as namoradas também eram amigas), duas barracas e o violão.
O Ivo estava começando a se notabilizar como o vocalista d´A Chave, a banda que tinha também o Orlando, o Paulinho, o Eli e o Zito, no contra-baixo, logo substituído pelo Carlão Gaertner. O Ivo e o cenário da Casa Branca, nas Mercês: tudo a ver.
Foram dias certos e criativos e nossas visitas a casa de Paulo Leminski e Alice, nas Mercês e depois no Pilarzinho, eram verdadeiros orgasmos coletivos em torno de música e poesia. Sorte minha por estar sempre ao lado dos dois, ouvindo o Ivo cantar e o Paulo poetar.
(Para aqueles que têm um exemplar da biografia Paulo Leminski, o bandido que sabia latim, existe algum registro destes encontros a partir da página 140).
Mas não está no gibi a visita que o Ivo nos fez à casa da rua Xavier Leal, em Ipanema, no final dos anos 70. Ele ligou antes dizendo que estava a caminho e quando chegou foi logo tirando uma fita cassete do bolso, explicando que era o playback do disco que estava gravando com a banda Blindagem (gravadora Continental), em São Paulo. “Está tudo ensaiado”, ele disse. Sentou-se no chão, à altura das caixas, deu um play no aparelho e começou a cantar. Cantou inspirado o disco inteiro... Foi simplesmente espetacular: Sou legal eu sei, Não posso ver, Marinheiro, todas... Não houve interrupção... Ele se exibiu muito pra Naná, que durante anos lembraria esta cena como um momento mágico e deslumbrante na vida de todos nós. (Eu tive a oportunidade de conversar com o Ivo, tempos depois, sobre este dia e sobre aquela luz.)
Impossível, no calor da despedida, fazer um relato fiel ou mesmo aproximado dos vários talentos do Ivo, como cantor, ator (foi o destaque na versão apresentada no Teatro Guaira para o Rock Horror Show) ou daquilo que vivemos juntos como amigos. Perdi muito da minha inocência hoje.
Toninho Vaz, de Santa Teresa